ANO X - N°
289, em 30 de dezembro de 2011.
Crônica
ENVELHECER É PARA MACHO!
Não aguenta com o tacho,
Sai de baixo,
Seu frouxo,
Não é macho? (*)
A velhice é uma droga!
Dei uma refrescada neste início de
texto. Inicialmente, tinha usado um qualificativo escatológico. Mas,
em nome da moral e dos bons costumes, arrefeci.
Sou velho. Sinto-me velho. A velhice
é uma droga, sem os possíveis benefícios de uma droga medicamentosa
e sem os delírios, às vezes gozosos, de uma droga alucinógena ou do
álcool. A ressaca é contínua.
Apropriei-me de uma frase perdida em
uma cena de um filme a que assisti recentemente (**)
para dar título a esta crônica. Um filme chatinho sobre um casal de
velhos recém-chegados a esse estado, em crise pela nova idade, quer
dizer, pela chegada da macróbia idade. Por quê? Simplesmente porque
tentavam recuperar o passado e não assumir a velhice. Ao final do
filme, o casal que tanto procurou uma saída, retornando sem sucesso
à juventude, se achou, amando-se no chão gramado de um cemitério.
Que metáfora mais lúgubre!
A dissimulação da velhice é a coisa
mais trágica que pode acontecer na idade madura. Acredito que essa
atitude não leva a nada, a não ser à depressão e às doenças
somatizadas pela agonia de não parecer velho. Assumir a velhice
talvez seja a melhor defesa contra os males da própria velhice.
Assim, como o princípio da homeopatia: similia similibus curantur.
Só que no presente caso não há cura e a alternativa à velhice é a
pior possível.
É constrangedor quando um jovem, ou
pior, uma bela jovem, como aconteceu comigo, pela primeira vez em
sua vida, lhe oferece o assento num ônibus lotado. A gente não está
devidamente preparado para esse acidente. A personagem do dito filme
indigna-se quando isso acontece com ela. Pior é quando uma bela
jovem chama você de tio. Pior ainda é, se mais íntima, achar você
uma gracinha.
Nada mais tragicômico do que um
velho com os cabelos e bigodes grisalhos pintados de negro como as
asas da graúna ou de acaju, parecendo um escandinavo dos trópicos.
Ou do que as dondocas com os seus lábios botocudos pela aplicação de
botox! Ou com suas peles esticadas cheias de creme hidratante: se a
coitada ri com mais soltura, fico com medo de sua pele vir a “pocar”,
como dizem os capixabas. Seria esse regionalismo uma corruptela de
espocar (ou espoucar)? O Houaiss registra pocar (arrebentar como
pipoca, pipocar), do tupi poka.
Voltando ao assunto.
Ridículo também são os neologismos ou eufemismos com que são
tratados os idosos: terceira idade, melhor idade etc. O tratamento
de jovem para com um velho é tão cínico e hipócrita quanto as
expressões melhor agora ou como você está bem! Agrega-se a isso o
fato que alguns sexagenários, recém-chegados à velhice, preferirem o
tratamento de idoso e rechaçarem o de velho. É cobrir a careca com
uma peneira, como esconder a idade.
O desenvolvimento da
neurociência, ao descobrir como funciona o centro do universo
individual, a mente, tem colaborado na continuação do tônus da vida
com drogas moderníssimas. Isso é bom! De certa forma é assim que
vivo: graças à medicina e à farmacologia. Que isso não venha
substituir a cuca fresca, que inclui um pouco de conhecimento da
vida como ela é. Perecível como os amores.
A palavra macho aqui empregada ainda
é uma expressão advinda do machismo que, no presente contexto, se
aplica também, e muito bem, a algumas mulheres (quase todas!).
Aliás, neste mundo de aparências e de consumismo quem mais precisa
ser macho neste particular são as mulheres.
O dramaturgo Nelson Rodrigues,
quando lhe perguntaram em uma entrevista qual o conselho que daria à
nova geração disse: envelheçam! Disse ainda: a juventude tem todos
os defeitos da velhice e mais um: a própria juventude. Portanto o
conselho que dou neste fim de página aos meus colegas de geração é o
mesmo, com um pequeno adendo: envelheçam com elegância, relaxem e
gozem os momentos de prazer, que ainda podem ser muitos e intensos.
Cada um que descubra o seu melhor caminho. Coroas do meu
Brasil: tomem tenência! Tenham juízo!
A propósito: assumi
minha barba branca.
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(*)
Trova recitada por meu pai, na minha
infância, enfatizando as últimas sílabas dos versos.
(**)
Late bloomers – O Amor
Não Tem Fim.