ANO VIII - N° 221, em 20 de junho de 2009.
Crônica da
crônica.
DA CADERNETA
PRETA COM PÁGINAS QUADRICULADAS
Meu avô materno, o único avô que conheci e com quem convivi, na
mesma casa dos meus pais, nos vinte primeiros anos de minha vida e,
consequentemente, nos vinte anos finais de sua vida, foi uma figura singular. Eu
já o havia retratado num número do JORNALEGO, de
10-09-2003,
com o título: “Meu Tipo Inesquecível”. O leitor pode acessá-lo clicando o atalho
a seguir.
http://ecen.com/jornalego/no_46_meu_tipo_inesquecivel.htm
Mais recentemente, um dos meus irmãos trouxe ao meu conhecimento uma
preciosidade que guardava a sete chaves: uma cadernetinha preta de páginas
quadriculadas do meu avô. Nela unicamente consta um pequeno relato do que
importou na vida desse meu antepassado. Ele se adiantou, em muito, ao cientista
Richard Dawkins (celebridade presente em algumas páginas do JORNALEGO) que, em
seu famoso livro “O Gene Egoísta”, diz que, sob o ponto de vista biológico, o
gene só tem uma preocupação: a sua reprodução, ou seja, a perpetuação da
espécie. Dawkins, um dos escritores mais lidos na atualidade no Reino Unido,
mesmo não sendo um literato, é um evolucionista convicto tendo ido muito além
(ou aquém) da teoria do mestre que a concebeu, incorporando nela o papel dos
genes, desconhecidos por Darwin; isto é, a evolução é válida também no mundo dos
genes.
Vejam, a seguir, o relato singelo e enxuto da vida do meu avô e o
que, segundo a sua ótica, foi o mais importante para ele. Na transcrição foi
mantida a ortografia da época e o estilo em que foi escrito. Entre parêntesis
notas do autor do JORNALEGO.
No dia
14 de abril de
1904, contratei casamento com Dona B. J.
Em data de
7 de abril de
1905, falleceu minha mãe adoptiva e sepultou-se no
cemitério de N.S. de Bôa Morte.
No dia
8 de julho de
1905, realisei o meu casamento. O acto civil teve logar as
4 horas da tarde na casa nº.
16 à Rua S. Francisco, onde passei a
residir em companhia de meus sogros e cunhado. O acto religioso effectuou-se na
Matriz de S.Thiago, às 5 horas da tarde. Serviram de testemunhas no acto civil (seguem
nomes) e no religioso (seguem nomes).
A
21 de Abril de
1906, às 5 horas da manhã nasceu A. e baptisou-se na
Igreja Matriz de S.Thiago no dia 8 de julho do mesmo anno.
No dia
31 de maio de
1907 às 2½ horas da tarde nasceu A. Baptisou-se em
19 de janeiro
de 1908.
A
7 de março de
1909 às 9½ da noite nasceu A. Baptisou-se em 19 de
setembro do mesmo anno.
A
25 de Agosto
de 1910 às 4½ nasceu A. Baptisou-se em
8 de Dezembro
de 1911 e falleceu no 16 do mesmo mez e anno. Sepultou-se no Cemitério da Bôa
Morte.
No dia
28 de julho de
1912, às 6 horas da tarde nasceu A. e baptisou-se a 1º
de janeiro de
1913.
A
18 de janeiro
de 1914, às 2 horas da tarde, nasceu A.. (Minha mãe). Baptisou-se no dia 29 de julho de 1915.
A
27 de janeiro
de 1925, a 1 hora da manhã falleceu A..
(Com 13 anos
incompletos).
A
3 de julho de 1930 comemoramos as nossas bodas de prata, fazendo
celebrar, na igreja de S.Gonçalo, as 8 horas da manhã missa em acção de graças,
sendo celebrante o vigário da Capital que também fez as cerimônias de bôdas de
accordo com ritual da Igreja. A estes actos assistiram nossos filhos, parentes e
pessoas amigas que também se reuniram à noite em nossa casa onde após o jantar,
dançaram até meia noite. Recebemos diversas dádivas.
Às
12,10 do dia
4 de Novembro
de 1933, falleceu depois de 4 mezes de padecimentos minha mulher. O seu
enterramento teve logar no mesmo dia, às 4 horas da tarde no cemitério de N.S.da
Boa Morte, sendo acompanhado por muita gente, apezar da chuva que cahia durante
todo o dia.
É só! Fim do relato constante na caderneta e de uma vida. Do
que valeu dela sob a sua ótica. O fulcro vital. A essência.
Meu avô faleceu às 9 horas na Associação dos Funcionários
Públicos no dia
10 de janeiro
de 1960, em Vitória (ES). Houve missa de corpo presente na Igreja de São
Gonçalo, a que assistiram filhos, parentes e irmãos da Confraria de Nossa
Senhora da Boa Morte e Assunção. O enterro foi no mesmo dia no cemitério Boa
Morte. Morreu aos 84 anos. Nasceu em
8 de Janeiro de 1876. Foi enterrado às 17 horas.
As informações do parágrafo anterior foram
baseadas nas anotações feitas por meu pai, fechando a caderneta. Além desses
registros, se me lembro bem, meu avô deixou um rádio de válvulas (herança de seu
cunhado), a cama onde dormia, um relógio de bolso e uma imagem da Sagrada
Família.
É só isso! A vida como ela é. Sem adereços.
Sem perfumaria.