Economia & Energia
Ano IX -No 50:
Junho-Julho
2005 
ISSN 1518-2932

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Estoque de Capital na América Latina: 1950-2000

Artigo:

O Balanço de Carbono nos Centros de Transformação de Energia

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 Artigo:

Balanço Energético nos Centros de Transformação


Carlos Feu Alvim
feu@ecen.com
Omar Campos Ferreira,
 Frida Eidelman 
frida@cen.com

Introdução

No No 48 foram publicados os primeiros resultados do estudo resultante do convênio entre o MCT e Economia e Energia cujos resultados foram apresentados àquele ministério em fevereiro de 2005. A conservação dos átomos de carbono se dá em todas as etapas do ciclo. Também ela se verifica no que concerne à energia no Balanço Energético, já que o que acontece são transformações entre uma forma de energia e outra. sendo a energia usada na transformação contabilizada no setor energético.

Os centros de transformação não são tratados de maneira homogênea no BEN. Em alguns casos é possível realizar separadamente o balanço de carbono da matéria prima e dos subprodutos (as emissões são computadas no Setor Energético de maneira conjunta); em outros casos, as emissões devem ser apuradas no próprio centro. No que se segue, lista-se a estrutura e a nomenclatura adotada pelo BEN,

Tipos de Centros de Transformação

O BEN trabalha com os seguintes tipos de centros de transformação:

·    Refinarias de Petróleo,

·    Plantas de Gás Natural,

·    Usinas de Gaseificação,

·    Coquerias,

·    Destilarias,

·    Carvoarias,

·    Centrais Elétricas de Serviço Público,

·    Centrais Elétricas Autoprodutoras,

·    Ciclo de Combustível Nuclear

·    Outras Transformações

Do ponto de vista do balanço de carbono podemos distinguir três (ou quatro) tipos de transformação:

·     Unidades de transformação onde o carbono entra como componente da matéria prima e sai sob a forma de produtos (derivados), não havendo contabilmente emissões de gases contendo carbono; neste tipo de transformação, não existe emissão de gases para a atmosfera (as cinco primeiras);

·     Unidades onde é necessário contabilizar, na saída, subprodutos e gases de rejeito contendo carbono (carvoarias)

·     Unidades que podem ser tratadas como centros de consumo, não havendo conteúdo de carbono nos produtos (centrais elétricas térmicas de serviço público e autoprodutoras)

Finalmente, existem unidades como as usinas de geração hidrelétrica e nuclear onde não existem produtos de carbono na entrada ou na saída e que não precisam ser tratadas para o estabelecimento do balanço de carbono. As emissões originadas em equipamentos auxiliares dessas unidades, como geradores a diesel e outras, devem aparecer em outras unidades de contabilidade como as correspondentes ao Setor Energético.

Veremos também que, nas unidades de transformação do primeiro tipo, o que existe é um artifício contábil onde as emissões são contabilizadas no Setor Energético.

No que se segue, serão apresentados alguns tipos de centro de transformação para ilustrar a abordagem adotada. É interessante notar que, mesmo nos casos de algumas das transformações onde as emissões não aparecem na contabilidade, a apuração do balanço é útil porque, no processo, verifica-se a coerência dos dados entre os insumos (utilizados na abordagem com os produtos intermediários contabilizadas) e os resultados obtidos a partir de coeficientes extraídos da apuração do inventário nacional de emissões que se supõe baseados em medidas de emissões avaliadas (“Bottom-Up”) para o tipo de combustível no setor, salvo nos casos em que a falta de dados tenha obrigado o uso de coeficientes genéricos em sua elaboração.

A Figura 1 apresenta o esquema de apuração do Balanço de Carbono em uma refinaria de petróleo.

Os compostos de petróleo, usados como fonte de energia na própria refinaria, são contabilizados como produto (saída) embora, fisicamente, o consumo de energia e as emissões se verifiquem na própria refinaria. A parte consumida na refinaria é lançada como “entrada” na contabilidade do Setor Energético onde também são computadas as emissões. O balanço de carbono deve “fechar” para o sistema constituído pela refinaria e pelo Setor Energético.

Um caso semelhante ocorre nas unidades de processamento de gás natural (úmido) onde são extraídos alguns subprodutos líquidos que podem ser incorporados diretamente aos produtos comercializados como gás liquefeito de petróleo (GLP), gasolina ou a nafta, uma fração que é tratada pelas refinarias e o gás natural denominado “seco” (fundamentalmente metano e etano).

A entidade “Setor Energético” é usada ainda para registrar todo o consumo nas unidades a ele relacionadas – inclusive centros de transformação. Este consumo não inclui a energia “transformada”[i] cujo tratamento é feito nos centros correspondentes de contabilidade.

Figura 1: Balanços para as refinarias e o Setor Energético

A entidade “Setor Energético” é usada ainda para registrar todo o consumo nas unidades a ele relacionadas – inclusive centros de transformação. Este consumo não inclui a energia “transformada”[ii] cujo tratamento é feito nos centros correspondentes de contabilidade.

Também é interessante assinalar que para o petróleo, seus derivados “não energéticos” integram o balanço energético; este procedimento será seguido no balanço de carbono[iii]. O fato do tratamento não ser uniforme para todas as fontes exige algumas adaptações metodológicas que serão oportunamente tratadas.

Na Figura 2, mostra-se o esquema adotado pelo BEN para as destilarias e ilustra-se a maneira de se fazer o balanço de carbono.

Figura 2: Esquema do balanço de carbono para as destilarias, mostrando que “produtos da cana” (denominação do BEN) são tomados como diferentes formas de energia primária. O bagaço é contabilizado no Setor Energético, mas o vinhoto não é explicitado no BEN. O melaço (concentrado de açúcar em destilarias anexas a usinas de açúcar) também é considerado como energia primária.

Nas coquerias (produção de coque a partir do carvão mineral) contabiliza-se como produtos o coque e o gás que é parcialmente consumido no processo mas contabilizado no setor energético. Espera-se, assim, que o balanço de carbono possa ser feito neste nível.

Espera-se que a produção do gás de rua (gás mais pobre que o natural distribuído para consumo) também possa ser tratada como centro de balanço de carbono. A diversidade de matérias primas usadas ao longo dos anos neste processo e a variação de sua composição deveria ocasionar, no entanto, dificuldades na contabilidade deste tipo de unidade. É bom lembrar que este é um combustível em extinção no Brasil com o advento da distribuição de gás natural seco diretamente aos consumidores (foram necessárias adaptações na rede e nos aparelhos de consumo).

No caso das carvoarias, a energia primária (lenha) é transformada em carvão pela queima parcial. Não existe um produto intermediário adequado para transferir o consumo para o setor energético (parte poderia ser atribuída ao monóxido de carbono – CO, mas isto não é feito). Além disto, todo o gás é usado no processo de transformação ou emitido diretamente. O balanço de carbono deve ser apurado adicionando-se o carbono contido no produto àquele que compõe as emissões, conforme é indicado na Figura 3.

Figura 3: Balanço de Carbono em uma Carvoaria.

Para as centrais de geração de eletricidade, estão disponíveis os valores de entrada correspondente aos combustíveis usados na geração. O balanço de carbono – de que estamos tratando – pode ser apurado, nessas unidades, da mesma maneira como será feito em setores consumidores, mesmo porque o produto (eletricidade) não contém carbono. O esquema do balanço de carbono é mostrado na Figura 4

Figura 4: Esquema de balanço de carbono em centrais elétricas; no caso de autoprodutores a unidade de balanço pode ser “virtual”, localizada, por exemplo, em um estabelecimento industrial. Os aportes hídrico e nuclear e o produto “eletricidade” que fazem parte do balanço energético não contribuem para o balanço de carbono. Os produtos tracejados indicam, neste caso, valores não computados no balanço. No caso das perdas, elas estarão incluídas nas diferenças encontradas no balanço de carbono.

Em virtude do exposto, a apuração do balanço de carbono em algumas unidades de transformação não envolve emissões e pode ser feita a partir dos resultados de conteúdo de carbono o que são apresentados, a seguir, para o período 1970 a 2002.

Balanço de Carbono nas Refinarias

Para cinco dos centros de transformação é possível apurar o balanço de carbono pré-emissões. O principal deles é o das refinarias de petróleo.

A Tabela 1 mostra o balanço de energia e carbono para 2002 indicando, ainda, os coeficientes expressos em tC/tep (tep de 10000 kcal) ou em tC/TJ (1 cal = 4,1855 j)

O balanço de carbono “fecha” com precisão semelhante ao do balanço de energia. Isso, como pode ser visto na Tabela 2, também é válido para anos anteriores. Além disso, a balanço de carbono é negativo, o que é compatível com perdas na transformação que não são registradas no BEN. Para o conjunto de petróleo processado entre 1970 e 2002, o saldo do balanço de carbono apresenta uma diferença de apenas –0,8% e um desvio médio quadrático de 1,0% nos valores anuais.

Tabela 1: Balanço de Energia e de Carbono nas Refinarias de Petróleo no Brasil  em 2002

 

ENERGIA

MASSA C

 

 

 

mil tep

mil t (Gg)

tC/tep

tC/TJ

ENTRADA

84002

70225

 

 

  PETROLEO         

83076

69543

0,837

20,0

  OUTRAS RECUPER.

926

682

0,737

17,6

SAÍDA

82939

69558

 

 

  OLEO DIESEL

27330

23106

0,845

20,2

  OLEO COMBUST.

17083

15087

0,883

21,1

  GASOLINA  AUTOMOT.

14445

11427

0,791

18,9

  GASOLINA  AVIACAO

54

44

0,816

19,5

  GLP

4657

3353

0,720

17,2

  NAFTA

6716

5622

0,837

20,0

  QUEROS. ILUM.

187

153

0,820

19,6

  QUEROS. AVIACAO

2978

2431

0,816

19,5

  GAS DE REFIN.

3222

2455

0,762

18,2

  COQUE  PETROLEO

1585

1825

1,151

27,5

  OUT.EN. PETROLEO

382

320

0,837

20,0

  ASFALTOS

1641

1511

0,921

22,0

  LUBRIFICANTES

728

610

0,837

20,0

  SOLVENTES    

536

448

0,837

20,0

  OUT.NAO   EN.PET.

1395

1167

0,837

20,0

SALDO DO BALANÇO

-1064

-667

 

 

 SALDO DOBALANÇO (%)  (*)

-1,3%

-1,0%

 

 

              (*) (Saída-Entrada)/Entrada

Na Tabela 2 estão representados os balanços de carbono para as refinarias para anos escolhidos. Além de anos redondos (final de década), foram escolhidos os anos de 1990 e 1994 (anos extremos de apuração do inventário nacional), 1999 (ano para o qual existem algumas avaliações) e 2002 (último ano computado).

Tabela2: Balanços de Carbono para anos selecionados (Massa de Carbono em  mil t (Gg))

 

1970

1980

1990

1994

1999

2002

ENTRADA

21376

46335

50807

54729

68474

70225

  PETROLEO         

21376

46335

50711

54326

68022

69543

  OUTRAS RECUPER.

0

0

96

404

452

682

SAÍDA

20817

45876

50784

54047

67824

69558

  OLEO DIESEL

4798

14146

17804

19282

22748

23106

  OLEO COMBUST.

7418

14537

10785

10760

14859

15087

  GASOLINA  AUTOMOT.

5822

6792

7050

9076

11278

11427

  GASOLINA  AVIACAO

0

0

46

65

60

44

  GLP

708

1952

2504

2887

2955

3353

  NAFTA      

58

2546

5254

4634

6475

5622

  QUEROS. ILUM.

523

437

167

111

53

153

  QUEROS. AVIACAO

547

1789

2070

1929

2496

2431

  GAS DE REFIN.

177

893

1612

1890

2064

2455

  COQUE  PETROLEO

0

0

528

636

1328

1825

  OUT.EN. PETROLEO

25

315

3

0

7

320

  ASFALTOS

0

0

1141

1186

1375

1511

  LUBRIFICANTES

0

0

572

599

598

610

  SOLVENTES    

0

0

202

285

298

448

  OUT.NAO   EN.PET.

742

2469

1046

705

1228

1167

SALDO DO BALANÇO

-559

-459

-22

-682

-650

-667

SALDO DO BALANÇO (%) (*)

-2,6%

-1,0%

0,0%

-1,2%

-0,9%

-1,0%

           (*) (Saída-Entrada)/Entrada

Os balanços de carbono e de energia têm, além disto, comportamentos muito semelhantes ao longo do tempo (Figura 5) o que indica que os coeficientes usados parecem permanecer válidos, não obstante as substanciais variações das características dos combustíveis usados no Brasil (principalmente do diesel), no período estudado. Esta mudança de características dos combustíveis ocorreu, sobretudo, no período das crises de petróleo quando a presença do álcool carburante (substituindo a gasolina) e o vigoroso processo de substituição do óleo combustível provocaram um aumento da participação do diesel no consumo de derivados de petróleo. Além disso, existia (e ainda existe) substancial vantagem no preço desse combustível por quilômetro rodado. A Figura 5 mostra que, não obstante as variações no combustível, o comportamento, ao longo do tempo, do balanço de carbono é muito semelhante ao do balanço de energia. Ou seja, as variações no balanço de carbono se referem principalmente a variações na contabilidade da energia e não aos parâmetros relativos ao teor de carbono.

É bom notar que o BEN apresenta um acompanhamento do conteúdo em energia dos combustíveis ao longo dos anos (tep por m3 ou kg). Estes dados são usados nos cálculos do teor em carbono e corrigem, em parte, essas variações. O mesmo pode não ocorrer quando – como acontece no caso do gás natural úmido – a transformação das “unidades naturais” (de massa ou volume) passa por um coeficiente constante para conversão em energia ao longo dos anos.

Figura 5: Os balanços de energia e de carbono mostram um comportamento semelhante ao longo dos anos e um baixo desvio de massa. Isto é indicativo da boa escolha dos coeficientes de teor de carbono e da pouca influência da mudança das características dos combustíveis no balanço de carbono nas refinarias

Balanço de carbono nas unidades de processamento de gás natural (UPGN)

Nas UPGN extrai-se do gás natural in natura (úmido) líquidos que se condensam à temperatura ambiente, restando no gás natural (seco) principalmente o metano e o etano. As frações líquidas podem ser incorporadas diretamente a alguns produtos (GLP, nafta, etc) ou serem tratados em refinarias. Como pode ser observado na Figura 6, este último parece ser o destino preferencial nos anos recentes, muito provavelmente por que facilita a maior homogeneidade dos produtos comercializados e simplifica a operação das UPGN.

Figura 6: A partir de 1992, cerca da metade do  produto das UPGN no Brasil passou a constituir-se na fração de condensados de gás natural que aparecem no BEN como matéria prima de entrada nas refinarias.

 O balanço de energia e de carbono é mostrado na Tabela 3, para o ano de 2002,  bem como os fatores utilizados para sua obtenção.

Tabela 3: Balanços de Energia e Carbono nas UPGN em 2002.

 

ENERGIA

MASSA C

 

 

 

mil tep

mil t (Gg)

tC/tep

tC/TJ

ENTRADA (GAS NAT. ÚMIDO)  

10125

6738

 

 

SAÍDA

9837

6453

 

 

    GAS NAT SECO   

8181

5239

0,640

15,3

    OUTRAS RECUPER.

836

616

0,737

17,6

    GASOLINA  AUTOMOT.

0

0

 

 

    GLP

755

543

0,720

17,2

    NAFTA      

66

55

0,837

20,0

SALDO BALANÇO

-287

-285

 

 

SALDO DO BALANÇO (%)  (*)

-2,8%

-4,2%

 

 

                      (*) (Saída-Entrada)/Entrada.

 

Na Tabela 4 o balanço de carbono é indicado para anos escolhidos.

Tabela 4: Balanço de Carbono em anos selecionados (massa em Gg)

 

1970

1980

1990

1994

1999

2002

ENTRADA (GAS NAT. ÚMIDO)  

380

894

2825

3352

4430

6738

SAÍDA

407

940

2884

3382

4501

6453

    GAS NAT SECO   

304

718

2219

2625

3442

5239

    OUTRAS RECUPER.

0

0

0

325

413

616

  GASOLINA    

28

60

134

98

178

0

  GLP

47

102

394

237

177

543

  NAFTA      

0

0

3

0

114

55

BALANÇO

-2

-14

-75

-68

-107

-285

BALANÇO (%)  (*)

6,9%

5,1%

2,1%

0,9%

1,6%

-4,2%

           (*) (Saída-Entrada)/Entrada                                                                                                

Na Figura 7 pode-se observar que, na maioria dos anos, o balanço energético não apresenta desvios acima do esperado, com exceção dos três últimos anos. Esta variação pode ser considerada importante e deve advir do uso de valores inadequados do poder calorífico no próprio balanço energético. Com efeito, o que se espera na representação gráfica é que variações devidas ao balanço energético sejam refletidas por curvas “paralelas” (mesma diferença). Já variações quanto ao conteúdo de carbono, refletir-se-iam numa aproximação ou afastamento entre as curvas. Este fenômeno (aproximação entre as curvas) parece estar ocorrendo na representação da figura em questão e pode ter como explicação a variação do conteúdo de carbono no gás úmido.

Figura 7: Balanços de carbono e de energia para UPGNs no Brasil, mostrando que alguns desvios do relativo ao carbono são atribuíveis a diferenças no de energia. Também parece existir um componente sistemático de defasagem dos dois balanços, que deve advir de coeficientes de carbono inadequados.

Em 2002 a quantidade de gás processada nas UPGNs (6,7 mil Gg) corresponde a 4,6% do total da massa de carbono dos combustíveis utilizados (oferta interna bruta) no Brasil. Erros da ordem de 6% (como os ocorridos em 2000) representam uma imprecisão de cerca de 0,3% no total. Como o gás natural é um combustível de importância crescente na matriz energética brasileira, seria necessário dar uma maior atenção ao assunto. [iv].

Balanço de Carbono nas Coquerias

Nas coquerias, o carvão metalúrgico é convertido em coque (usado na fabricação do aço) em um processo de destilação sem a presença de oxigênio. Como subprodutos são gerados gases que são utilizados como combustível nas siderúrgicas, inclusive na própria coqueificação e líquidos. Os balanços energético e de carbono estão mostrados na Tabela 5 para o ano de 2002.

Os gases constam no balanço como gás de coqueria e os líquidos como alcatrão. O BEN opta por alocar todo o consumo nas siderurgias  (nada no setor energético). Na falta de coeficiente específico optou-se, no inventário, pelo uso do coeficiente ‘default”, que corresponde ao do petróleo. O mesmo coeficiente foi usado para o balanço de carbono.

O balanço de carbono para o ano de 2002 é, como seria de se esperar, negativo já que as perdas não são contabilizadas. Desvios de 6%, como observados no saldo dos balanços de carbono e de energia, evidenciam coeficientes inadequados ou erros de apuração da matéria prima ou produtos. Do pondo de vista de importância na determinação do carbono emitido, o processo envolve cerca de 7,4 milhões de toneladas de carbono que representa 4,7% da oferta interna bruta de carbono. Um erro de 6,3% no balanço de carbono significa um erro de 0,3% nas emissões. É bom lembrar que, pelo menos neste caso, as indicações são de que o erro está no próprio balanço energético,

Tabela 5: Balanços Energético e de Carbono nas Coquerias 2002

 

ENERGIA

MASSA C

Massa C /Energia

 

mil tep

mil t (Gg)

tC/tep

tC/TJ

ENTRADA

6881

7431

 

 

   CARVAO MET.NAC.

63

68

1,080

25,8

   CARVAO MET.IMP.

6819

7363

1,080

25,8

SAÍDA

6721

7901

 

 

   COQUE CARV.MIN

5126

6565

1,281

30,6

   GAS DE COQUERIA

1366

1144

0,837

20,0

   ALCATRAO

229

192

0,837

20,0

SALDO DO BALANÇO

-160

470

 

 

SALDO DO BALANÇO (%)

-2,3%

6,3%

 

 

Os saldos dos balanços de carbono, para anos escolhidos, são mostrados na Tabela 6. A evolução dos saldos em energia e carbono nas coquerias, no período 1970 / 2002, pode ser acompanhada na Figura 8 .

Tabela 6: Balanços de Carbono nas Coquerias em Anos Escolhidos

 

1970

1980

1990

1994

1999

2002

ENTRADA

1714

4383

8143

8692

7492

7431

    CARVAO MET.NAC.

496

1083

487

82

21

68

    CARVAO MET.IMP.

1218

3300

7655

8609

7471

7363

SAÏDA

1740

4541

8114

8811

7780

7901

  COQUE CARV.MIN

1426

3768

6745

7301

6441

6565

    GAS DE COQUERIA

264

624

1144

1264

1130

1144

    OUT.SEC.  ALCATRAO

50

149

225

246

210

192

SALDO DOBALANÇO

26

158

-29

119

289

470

SALDO DOBALANÇO (%)

1,5%

3,6%

-0,4%

1,4%

3,9%

6,3%

 

Figura 8: Os balanços de carbono mostram um erro sistemático na determinação do saldo de carbono, provavelmente devido a coeficientes inadequados de massa de C/energia. Os saldos de balanço também são importantes no energético, mas podem ser, pelo menos em parte, atribuídos a perdas.

Os dados da Figura 8 confirmam os problemas no balanço de carbono que seriam atribuíveis ao uso de coeficientes inadequados.

Balanço de Carbono nas Usinas de Gaseificação

O uso do gás canalizado estava, em 1970, praticamente restrito às cidades do Rio de Janeiro e São Paulo. O gás para distribuição na rede existente era produzido nas usinas de gaseificação. As matérias primas utilizadas em sua fabricação passaram, entre 1970 e 2002, da predominância de carvão mineral (em sua maior parte metalúrgico) para a nafta (derivada do petróleo) e finalmente para gás natural seco. A disponibilidade de gás natural para a distribuição fez com que, em 2002, restasse somente uma produção residual nestas usinas, que tende a desaparecer.

Figura 9: A matéria prima usada na produção de gás nas usinas de gaseificação  passou do carvão mineral para nafta e desta para o gás natural. Com a disponibilidade deste último, as redes de distribuição passaram a usar gás natural seco e as usinas de gaseificação estão praticamente desativadas.

A Figura 10 mostra que o balanço de carbono é inteiramente insatisfatório podendo ser observados desvios superiores a 70% e de até 150%. A qualidade do balanço em energia também se deteriora ao longo do tempo.

 Figura 10: O balanço de carbono das usinas de gaseificação mostra saldos enormes ao longo do período, refletindo a má qualidade dos coeficientes usados. A evolução ao longo dos anos (ver figura anterior) faz supor que os coeficientes usados para a nafta e para o gás natural são piores que para o carvão mineral.

Os balanços de energia e de carbono são mostrados na Tabela 7 para o ano de 1990[v]

Tabela 7: Balanços de Energia e de Carbono em
Usinas de Gaseificação para o ano 1990

 

ENERGIA

MASSA C

 

 

 

mil tep

mil t (Gg)

tC/tep

tC/TJ

ENTRADA

333

245

 

 

Gás natural Seco

170

109

0,640

15,3

Carvão Mineral

0

0

 

 

Nafta

163

137

0,837

20,0

SAÍDA

301

372

 

 

  GAS CIDADE

301

372

1,235

29,5

  COQUE CARV.MIN

0

0

 

 

SALDO DO BALANÇO

-32

126

 

 

SALDO DO BALANÇO (%)

-9,7%

51,4%

 

 

Examinando os coeficientes da Tabela 7, o que parece mais provável é que o gás produzido (gás de cidade) tenha mudado bastante sua composição quando mudou a matéria prima. O gás produzido a partir do carvão poderia conter monóxido de carbono, o que explicaria o alto valor do coeficiente utilizado. Quando esse gás foi substituído, para não mudar as características do gás distribuído, optou-se por empobrecer o gás gerado a partir da nafta e o gás natural seco. Se, por exemplo, o gás produzido a partir do gás natural resultar da adição de gás inerte, a razão massa de C / energia estaria muito mais próxima da referente ao gás natural (15,3 tC/TJ) do que da utilizada (29,5 tC/TJ), que seria adequada para um gás com alto teor de monóxido de carbono, para o qual este coeficiente estaria adequado.

Em 1990 a massa de carbono envolvida na transformação (entrada) seria de 245 Gg para uma oferta interna bruta de cerca de 120 mil Gg, correspondendo a 0,2% da massa do combustível utilizado. Um erro de 50% nessa avaliação corresponderia a 0,1% do total das emissões. Como se trata de um combustível em extinção, essa imprecisão na avaliação, embora incômoda do ponto de vista metodológico, terá impacto nulo nas emissões futuras. O impacto nas emissões passadas não deve ser muito superior ao apurado para 1990.

Balanço de Carbono nas Destilarias de Álcool

O setor álcool e a geração hidrelétrica são o carro chefe dos programas brasileiros de produção de energia renovável. Muito embora o CO2 produzido pela biomassa não seja computado nas emissões geradoras de efeito estufa, o mesmo não acontece com as emissões de metano que são contabilizadas. Além disso, ao serem consideradas em equivalente de dióxido de carbono, usando as equivalências do Protocolo de Quioto (GWP – Potencial de Aquecimento Global), podem reduzir significativamente o impacto atribuído ao uso do álcool. O balanço de carbono neste tipo de unidade é relevante na demonstração da política brasileira para atenuar o efeito estufa.

O balanço de carbono das usinas de álcool para 2002 é mostrado na Tabela 8 e apresenta um saldo negativo de 27% em massa de carbono. O mesmo acontece para os anos selecionados, como pode ser visto na  Figura 11 e na Tabela 9.

Tabela 8: Balanço de Energia e Carbono nas Destilarias em 2002

 

ENERGIA

MASSA C

 

 

 

mil tep

mil t (Gg)

tC/tep

tC/TJ

ENTRADA

6701

5609

 

 

    CALDO DE CANA

4797

4016

0,837

20,0

    MELACO

1904

1594

0,837

20,0

    OUTRAS RECUPER.

0

0

 

 

SAÍDA

6586

4083

0,620

 

    ALCOOL ANIDRO 

3759

2330

0,620

14,8

    ALCOOL HIDRAT.

2828

1753

0,620

14,8

SALDO DO BALANÇO

-115

-1527

 

 

SALDO DO BALANÇO (%)

-1,7%

-27,2%

 

 

Era de se esperar que nas destilarias houvesse um saldo negativo no balanço, uma vez que o vinhoto, que contém compostos orgânicos, não entra no balanço. Como esse rejeito pode ter uma contribuição às emissões, inclusive de metano, seria conveniente incluí-lo no balanço de carbono.

Por outro lado, os coeficientes de emissão usados para o caldo de cana e para o melaço basearam-se em valores genéricos recomendados para fontes de biomassa na metodologia do IPCC. Também os coeficientes do álcool anidro e hidratado – usados na abordagem “Top-Down” do inventário – basearam-se no fator de emissão médio da frota nacional, calculado a partir de medidas da CETESB em veículos.

Tratando-se de composto de composição conhecida, o fator de emissão – que relaciona a massa de carbono com a energia – pode ser obtido com boa aproximação a partir da composição do álcool.[vi] O uso deste fator, baseado no álcool etílico puro, “fecharia” o balanço com melhor aproximação.

 

Figura 11: Saldo do balanço de energia e de carbono para as destilarias, que apresenta para o carbono um grande déficit no produto formado.

Tabela 9: Balanço de Massa de Carbono em Destilarias para Anos Selecionados

 

1970

1980

1990

1994

1999

2002

ENTRADA

304

1928

5718

5885

5872

5609

    CALDO DE CANA

68

1498

5009

4970

4464

4016

    MELACO

235

410

675

884

1409

1594

    OUTRAS RECUPER.

0

19

33

32

0

0

SAÍDA

201

1194

3652

3995

4194

4083

    ALCOOL ANIDRO 

77

720

281

926

2043

2330

    ALCOOL HIDRAT.

124

474

3371

3069

2151

1753

SALDO DO BALANÇO

-103

-734

-2066

-1890

-1678

-1527

SALDO DO BALANÇO (%)

-33,8%

-38,1%

-36,1%

-32,1%

-28,6%

-27,2%

A cana de açúcar - sem contar pontas e folhas - é hoje a segunda maior fonte de energia primária pelos critérios do BEN, correspondendo a 13% em energia, tendo superado a lenha e a energia hídrica (correspondência calorífica). A participação em massa de carbono é ainda maior (18% do total). O tratamento do balanço de carbono (e do de energia) deveria, em futuras abordagens, merecer atenção especial.

Demais Centros de Transformação

Nos demais centros de transformação (carvoarias e centrais elétricas), as emissões de gases lançados na atmosfera são contabilizadas nas próprias unidades e é necessária sua quantificação para estabelecer o balanço de carbono. Isto será mostrado em um próximo número desta revista, juntamente com os setores de consumo.

Conclusão

O balanço de carbono dos centros de transformação revelou-se muito útil na detecção de problemas na apuração das emissões de gases de carbono. Os problemas mais importantes detectados se encontram na área de biomassa especialmente na produção de álcool. Para o álcool existe, além disso, um aparente erro no teor de carbono utilizado no inventário brasileiro que considera apenas o do CO2 emitido.

Os coeficientes usados na primeira apuração do inventário nacional, foram em sua maioria, coeficientes genéricos para biomassa sólida ou biomassa líquida. Devido a importância do setor álcool na matriz energética brasileira um tratamento mais preciso seria desejável. Note-se que, não obstante as emissões de CO2 não serem contabilizadas, as de metano o são e podem, por exemplo, reduzir o eventual crédito de carbono pelo uso do álcool motor. Os balanços de carbono e energético nas refinarias apresentam bons resultados não obstante a grande variação na composição dos derivados de petróleo no Brasil após o choque dos preços de petróleo de 1979.

Como a energia não se conserva nos centros de transformação em virtudes de perdas inerentes aos processos, não existe no Balanço  Energético a apuração sistemática do balanço de energia nestes centros. No entanto, para alguns deles (onde o consumo é computado no setor energético) existem aparentes falhas nos coeficientes que podem ser corrigidas em edições futuras. Um exemplo disto é o uso do mesmo coeficiente  energia/volume para o gás natural úmido em anos diferentes apesar do percentual de produtos líquidos obtidos nas UPGN serem diversos.

 


Notas:

[i] No caso das refinarias, por se tratar de reações químicas, onde a geração de calor (energia consumida) e a transformação (mudança de constituição dos hidrocarbonetos)  não têm uma fronteira definida. A especificação de um produto intermediário (como o óleo combustível) para ser contabilizado como produto da refinaria e fonte de energia usada no setor energético é, na verdade, um artifício contábil para montar o balanço energético. Aliás, um dos atrativos de se introduzir o setor energético no balanço (energético) é que ele torna mais elegante a contabilidade dos centros de transformação, contabilizando as perdas como gastos no setor energético.

[ii] No caso das refinarias, por se tratar de reações químicas, onde a geração de calor (energia consumida) e a transformação (mudança de constituição dos hidrocarbonetos)  não têm uma fronteira definida. A especificação de um produto intermediário (como o óleo combustível) para ser contabilizado como produto da refinaria e fonte de energia usada no setor energético é, na verdade, um artifício contábil para montar o balanço energético. Aliás, um dos atrativos de se introduzir o setor energético no balanço (energético) é que ele torna mais elegante a contabilidade dos centros de transformação, contabilizando as perdas como gastos no setor energético.

[iii] O mesmo não acontece, por exemplo, com o açúcar, que poderia ser encarado como um produto “não energético” (pelo menos do ponto de vista do balanço energético) da cana.

[iv] No que se refere ao gás natural, foram identificados problemas de aparente inconsistência na diferença dos poderes caloríficos superior e inferior e o conteúdo de carbono esperado. Também chama a atenção a constância dos valores dos poderes caloríficos ao longo do tempo. Este valor deveria, em princípio, sofrer alterações com a variação da procedência do gás natural (produtos condensáveis à temperatura ambiente, nele contidos).

[v]  O ano de 2002, usado em casos anteriores, apresenta uma baixa quantidade de matéria prima tratada e de apenas um tipo (gás natural).

[vi] Para o álcool etílico, o valor de “handbbok” do poder calorífico inferior (PCI) é 6621 kcal/kg ou 0,027712 TJ/t. Isto corresponde, para o álcool etílico, 36,085 t/TJ. Tratando-se do composto C2H5OH, tem-se 24/46 x 36,085 tC/TJ ou 18,8 tC/TJ. O valor do PCI fornecido pelo BEN para o álcool anidro é 6750 kcal/TJ, que daria 18,5 tC/TJ

 

 

 

Graphic Edition/Edição Gráfica:
MAK
Editoração Eletrônic
a

Revised/Revisado:
Tuesday, 11 November 2008
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