Economia & Energia
Ano VIII -No 45:
Julho-agosto 2004  
ISSN 1518-2932

No 46setae.gif (977 bytes) English Version     
 

BUSCA

CORREIO

DADOS ECONÔMICOS

DOWNLOAD

e&e ANTERIORES

 

 e&e No 46

Página Principal

Opinião:

Estado Pequeno & Grandes Empresas 

Artigo:

A Prospectiva Tecnológica: Previsão com um Simples Modelo Matemático (2)

Textos para Discussão:

De Volta ao Petróleo

Evolução do Investimento no Brasil

e&e por autor
e&e por assunto

http://ecen.com
Vínculos e&e

guestbook

Veja também nosso suplemento literário

http://ecen.com/
jornalego

Opinião:

ESTADO PEQUENO & GRANDES EMPRESAS

 

Genserico Encarnação Júnior
jornalego@terra.com.br

Vou ferir uma tecla muito sensível que vai destoar da melodia que vem sendo tocada, principalmente através de belas peças promocionais veiculadas pela imprensa, decantando a atuação desses grandes empreendimentos e de suas maravilhosas benesses derramadas por sobre a terra dos capixabas.

Proponho uma tese: são relativamente pequenos (embora não desprezíveis) os retornos ou benefícios que a sociedade capixaba recebe das grandes empresas que atuam no Espírito Santo. Pelo porte de suas atividades e vulto de seus negócios, o Estado merece mais. Entre os benefícios destacam-se os recursos decorrentes das folhas de pagamento do pessoal e os projetos sociais dirigidos a alguns setores e comunidades.

As grandes empresas aqui aludidas são: o complexo portuário-siderúrgico da Companhia Vale do Rio Doce/Associadas (CVRD), com suas sete usinas de pelotização, a Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST), a Aracruz Celulose e a Samarco Mineração. Tendo em vista a atual situação e as excelentes perspectivas em suas áreas de atuação, incluem-se também neste rol a Petrobrás e suas congêneres. Estas, compreendendo as concessionárias para exploração e produção de petróleo e gás natural admitidas após a flexibilização (quebra efetiva) do monopólio estatal do petróleo. A elas, finalmente, acrescenta-se a Escelsa, principal empresa de energia elétrica do Estado.

Com exceção da Petrobrás que, assim mesmo, perdeu a exclusividade de executar o monopólio estatal do petróleo no governo passado, todas as outras são empresas privadas. A CVRD, a CST e a Escelsa foram privatizadas no passado recente.

Não dispomos de dados e informações precisos. Desde o século passado não mais milito na lides profissionais. Nem por isso é inválida a pretensão de levantar uma hipótese no exercício do tão badalado direito de cidadania.

Acredito que essas empresas devam perfazer quase 20% do Produto Interno Bruto (PIB) capixaba, uma grande participação que lhes confere uma importância estratégica muito maior do que esta percentagem representa.

Uma digressão acadêmica cabe a esta altura. O PIB é a soma da produção, durante um determinado período, num considerado espaço (o país, o estado, o município), sem considerar a origem dos fatores de produção que o origina. Não faz distinção se eles são autóctones ou vêm de fora. Já o Produto Nacional Bruto (PNB) refere-se ao mesmo somatório, com uma diferença: ele só agrega a produção realizada a partir de fatores de produção nacionais. A palavra “nacional” pode ser substituída por “estadual” ou “municipal” no caso destes serem os espaços considerados. À diferença entre o PIB e o PNB denomina-se “renda líquida enviada para o exterior” (aqui relacionado também ao espaço considerado).

A participação daquelas empresas no PNB estadual (ou Produto Estadual Bruto) é inferior ao seu PIB, porque a maioria dos fatores de produção utilizados procede do “exterior”. Assim, esta diferença contábil refere-se à renda líquida remuneradora dos fatores de produção que vêm de fora, embora o teatro das operações de produção seja local.

A boa atuação dessas empresas também distorce a interpretação dos resultados estatísticos do Estado. É comum ser informado que o ritmo de expansão do PIB estadual e de sua renda per capita, desde meados dos anos 80, tem evoluído acima da média brasileira. Que, eventualmente, nosso crescimento industrial é o melhor do país. Por seu turno, o consumo de energia per capita do Espírito Santo é o maior do Brasil, maior inclusive do que o do estado de São Paulo e do que a média nacional. Trata-se, na realidade, de uma forte economia dentro da economia, quase um estado dentro do estado. Esses bons resultados não refletem necessariamente a situação sócio-econômica do Espírito Santo.

Os investimentos iniciais, embora aplicados aqui, remuneraram fatores de produção externos: capital financeiro, equipamentos, material, tecnologia e trabalho qualificado. Na continuação desses investimentos, é pungente a luta de nossa indústria para chegar, admitamos, a um percentual aceitável de 20% do total, que acredito esteja longe de acontecer. Há que se ter capacitação local, é lógico, o que deve ser conseguido através de um esforço comum de empresas e fornecedores.

Outras considerações seguem-se às anteriores. A Aracruz confessa numa de suas peças publicitárias que ocupa 4% do território estadual com plantações de eucaliptos. Sem considerar a extensão de terra plantada no sul do vizinho estado da Bahia. Se tivermos 25 empresas do porte da Aracruz, utilizando o mesmo percentual que ela ocupa no Estado (4%), não haveria espaço em nosso território para o capixaba morar. Trata-se, portanto, de uma extensa área agricultável para atender aos objetivos de uma única empresa.

A agressão ao meio ambiente por parte dessas empresas é notória e não poderia ser diferente dados o porte e a natureza de suas atividades. O céu de Vitória no início da noite transforma-se num cenário lindo com o reflexo das luzes da cidade nas nuvens róseas carregadas de impurezas. As varandas e áreas externas das residências na rota dos ventos predominantes têm que ser limpas todos os dias, sob pena de estarem constantemente cobertas de uma camada fina de pó de minério.

A CVRD é a principal responsável pela emissão do pó que suja os ambientes, enquanto a CST responde pela poeira inalável, mais fina e que não se vê, mas respira-se.

A Aracruz, CVRD, Samarco e CST têm suas produções voltadas predominantemente para a exportação. Geram divisas importantes para o bom equilíbrio do Balanço de Pagamentos Nacional, que servem em grande parte para saldar o serviço da dívida. Para isso são fortemente incentivadas pelo Governo Central. Não pagam impostos estaduais sobre essas operações. Por decorrência, ainda geram créditos fiscais dos impostos recolhidos sobre os insumos incorporados à produção (bens e serviços), que não podem ser honrados pela Fazenda Estadual, por insuficiência de recursos. A Lei Kandir, que instituiu essa desoneração das exportações, preconiza uma recompensa aos Estados, que vem sendo feita muito aquém do devido.

Um capítulo importante é o da energia. Neste particular, há que se creditar a Aracruz e a CST o fato de cogerarem uma substancial parcela de suas necessidades de energia elétrica utilizando rejeitos dos processos industriais, sobra de madeira e gases siderúrgicos. A Samarco também construiu uma pequena hidrelétrica (Muniz Freire) para atender as suas demandas. Absorvem, contudo, em conjunto, grandes cargas de energia elétrica, especialmente a CVRD. Além disso, esta empresa é a maior compradora do gás natural produzido pela Petrobrás no estado para a produção de pelotas de ferro (“pellets”). Atualmente estão sendo desenvolvidos dois campos marítimos de gás natural não associado (Cangoá e Peroá) para servirem à CVRD e a seus planos de expansão. Possivelmente na construção de uma fábrica de ferro esponja, em associação com a Petrobrás. Em detrimento da possibilidade de utilização desse gás na geração termelétrica.

Por falar em energia elétrica, a Escelsa, depois de sua privatização, há duas décadas, ainda não incorporou à capacidade de geração estadual nenhuma substancial oferta. O Estado continua importando 80% de suas necessidades, na frágil situação de ponta-de-linha do sistema sul-sudeste. Sua venda caracterizou-se pelo pecado original de todo o processo de privatização do setor elétrico. Passaram às mãos da iniciativa privada a caixa registradora da companhia. O catecismo é sempre o mesmo: primeiro cobrir os pequenos lances das compras, depois pagar dividendos aos acionistas e só depois, se sobrar algo, investir.

A Escelsa é uma das grandes arrecadadoras de ICMS para o Estado. Depois não se sabe porque aumentam as alíquotas deste imposto sobre energia elétrica! Falta base de incidência em outras atividades, como as voltadas para a exportação.

A grande expectativa de produção de petróleo e gás natural no estado, se não tiver a contrapartida de investimentos industriais correlatos que agreguem valor, vai se constituir numa atividade que nem sequer passa pelo território capixaba. No mar será produzido petróleo e ele pode, do mar, procurar seu destino, sem tocar a terra. Deixando aqui um relativamente pequeno royalty que, inclusive, pode vir a acabar. Existe um movimento mundial das produtoras de petróleo no mar pleiteando a desobrigação de pagar royalties em vista da aplicação de vultosos investimentos. Isso num previsível contexto internacional de escassez de petróleo.

Uma refinaria voltada para a exportação, como a que se aventa por aqui, que receba o óleo do exterior e mande derivados para alhures, pode gerar poluição, pouco emprego operacional e um contingente de desempregados dispensados logo depois de sua inauguração. Aliás, os grandes investimentos, na fase de sua construção, são grandes responsáveis pelo aumento populacional de nossas periferias em vista da grande contratação de mão de obra não-qualificada, logo depois dispensada.

Uma série de questões poderia ser ainda levantada sobre a melhor adequação entre essas grandes empresas e o pequeno estado que lhes serve de anfitrião.

Diante do exposto, seria uma interessante sugestão promover, através de uma auditoria independente, a elaboração de um Balanço Econômico-Social da atuação pretérita e futura dessas empresas no Espírito Santo. Não para lhes ser hostil, nem tampouco emperrar seus planos de expansão. O objetivo seria pleitear do Governo Federal e das próprias empresas uma postura mais cooperativa, otimizando-se os benefícios à Sociedade Capixaba, considerados simplesmente o retorno justo ao que lhes é proporcionado pela bela terra e pelo povo capixaba.

 

Graphic Edition/Edição Gráfica:
MAK
Editoração Eletrônic
a

Revised/Revisado:
Thursday, 02 December 2004
.

Contador de visitas